28/12/24

DO REPUXO AO LAVARINTO



O repuxo tem um nome maravilhoso, é apenas repuxo, mas não repuxa nada. Recolhe água do chafariz, aproveita o desnível e oferece a água a quem passa e a outras pessoas. Noutros tempos era o centro da aldeia. As lojas de muitas profissões circundavam o belo lago circular e o repuxo dava água a todos os animais que por ali passavam. Os burros com as suas carroças, os cães e gatos que viviam na mais bela liberdade e o pequeno lago também era habitado por peixes de tamanhos variáveis. Gostava de ficar ali a perceber como aquela máquina funcionava e era junto dele que comia o pão  com queijo da aldeia. Foi ali que levei o primeiro puxão de orelhas e pela primeira vez vi gelo. Nas manhãs de primavera misturavam-se, o ruído da água a correr com as andorinhas que por ali passavam para beber água. Os idosos aproveitavam para usar o precioso líquido para lavar as mágoas e sacudir as moscas.

O lavarinto foi construído com um objetivo muito nobre: ajudar as donas de casa do sítio a lavar a roupa. Esta água não se cruzava com a da fonte anterior. Chegava ali límpida e tranquila. Poucas pessoas vi ali lavarem roupa. O que era normal era ver tudo verde com plantas que não havia noutro lado. A minha mãe preferia ir mais longe ... nunca lá lavou.


HOJE E SEMPRE, ARLINDO DE CARVALHO


 

06/12/24

RUA NOVA - SOALHEIRA

Nos primeiros anos morei, na rua nova, de uma aldeia que hoje é vila. Lembro os natais da minha primeira dezena de anos,, com muito carinho e muita alegria. Tudo encaixava facilmente numa liberdade e num respeito que todos os meus vizinhos cultivavam como os nabos no inverno. Tudo fluía sem sobressaltos e sem discussões. O vento gelado que soprava da serra convidava a procurar a lareira e os preparativos para o natal decorriam com simplicidade e tranquilidade. Presentes? ... sorrisos e filhoses, lindas manhãs de nevoeiro e gelo, na rua onde nasci!

Manhãs brancas cheias de muros cobertos de silêncios. Aproveitei os tempos como se fosse o melhor da vida. Apesar da penumbra do tempo tentar apagar as minhas lembranças recordarei sempre a minha família, os meus amigos e as botas molhadas que faziam corar a minha mãe.

A rua continua a chamar-se nova e a rampa de 80 metros lá continua cheia de paralelepípedos de granito. 

É sempre bom regressar àquele canto do mundo.